Eu tenho um conselho pra te dar. Se eu tivesse feito a seguinte pergunta mais vezes na minha carreira, provavelmente teria me frustrado menos. Mas teria aprendido menos também.
A pergunta é: o que significa sucesso para as pessoas de produto aí na sua empresa?
Se, por um lado, ter a resposta para essa pergunta adianta e delimita um escopo, um contexto, um jeito de trabalhar, por outro lado também não te dá a oportunidade de transformar e evoluir.
Eu gosto de contar essa história, por que vivi uma situação parecida. Não fiz essa pergunta antes de me juntar ao time e quando cheguei me vi num cenário de produto que quase me fez desistir e pedir pra sair.
Calma, não era tão terrível assim. As pessoas eram inteligentes, o produto inovador. Tinha muita coisa interessante pra fazer mas do jeito que o time de produto estava estruturado provavelmente não conseguiríamos fazer nada disso.
Qual era o contexto? Cubículos. Reuniões confusas. Demandas. Soluções. Prazos. Ansiedade.
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Os times de produto, engenharia e design trabalhavam em áreas, cada um no seu quadrado, assim como o restante da empresa. As discussões com stakeholders internos eram listas de desejos passadas de um lado para o outro, sem muita evidência ou profundidade, mas sempre com muita urgência. E os pedidos: super específicos, pequenas otimizações ou projetos grandes e complexos.
Nesse modelo de trabalho, o principal critério de sucesso para nós, as pessoas de produto, era: mapear os requisitos das áreas e entregar as features o mais rápido possível. Não tínhamos contexto da estratégia da empresa e das necessidades dos cliente.
Éramos um time técnico. A liderança e gestão era técnica, as discussões eram técnicas, 80% do tempo gasto em mapear e descrever requisitos nos mínimos detalhes. Éramos um time reativo, que priorizava o backlog com base na urgência. E pior, todo o time de tecnologia era visto como um gargalo e um gerador de ansiedade para o restante da empresa.
Estava longe do ideal, então busquei visões e percepções de outras pessoas de dentro da empresa e comecei a abrir caminhos para uma nova maneira de se trabalhar.
Primeiro, voltei à pergunta inicial: o que então deveria significar sucesso para as pessoas de produto aqui?
Cheguei nos seguintes 3 pontos:
– Construir bons diagnósticos, embasados por dados de clientes, do negócio, do mercado. – Dar contexto e direção de longo prazo para o time. – Gerar impacto em receita, custos e proposta de valor para o cliente.
Depois, desenhei uma proposta para uma nova estrutura organizacional e novo papel de produto.
Propus 3 mudanças chave:
– Times multidisciplinares, distribuídos na jornada do cliente (awareness, conversão, pagamento, etc). Isso nos daria profundidade em escopos menores, mais contexto, mais foco e, principalmente, objetivos únicos com outros stakeholders. – Liderança dos times: pm liderando o escopo/contexto do produto, em todas as camadas – estratégia, saúde financeira, execução. Sendo porta-voz do time, tendo responsabilidade e também poder de decisão. – Liderança do chapter: de produto. Não de negócios, não de tecnologia. Liderança com experiência e bagagem gerando os critérios de sucesso acima mencionados. Visando unir todas as disciplinas no mesmo racional, na mesma estratégia de longo prazo.
Pois bem, embora tenha conseguido convencer a alta liderança a experimentar esse novo modelo de organização a mudança cultural foi (e ainda é) um processo de amadurecimento.
Depois de um tempo rodando o modelo aprendi que não basta a nova estrutura, papéis, responsabilidades, critérios de sucesso.
É preciso também:
– PM deixar de gastar tempo preenchendo as “disfunções” do time. É preciso que o trio de produto, design e engenharia desempenhe bem em cada disciplina. – Time de design e engenharia mais empoderados e seniors, liderando a definição e estratégia tática das soluções. – Pessoas de produto mais seniores, com capacidade de dar direção para times grandes e multidisciplinares.
Mas, voltando ao início. Naquele momento, antes de entrar na empresa, falhei em não reconhecer um contexto de produto que trabalhava de maneira isolada e técnica e que não combina com o meu jeito de construir e evoluir produtos.
Por outro lado, tive sorte de cair numa empresa que se abriu para repensar e evoluir o modelo de trabalho e o papel de produto e pude liderar e co-construir essa transformação. Um processo difícil mas ao mesmo tempo cheio de aprendizados ao longo do caminho.