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Com a ascensão das equipes de produto e tecnologia como motores essenciais dos negócios, a gestão eficiente de produtos e dados tornou-se uma peça central para o sucesso empresarial. Como os líderes de tech e produto enfrentam o desafio de equilibrar a complexidade dos dados com a busca incessante pelo ROI e pela inovação? Para descobrir mais sobre essas estratégias cruciais, conversamos com Cheila Portela, Head de Produto e Dados na Vibe Saúde.
Nesta entrevista, exploramos os bastidores da gestão de equipes de produto e dados, discutindo também a importância de comunicar o valor do time para a alta liderança. Além disso, Cheila compartilha suas ideias sobre como estabelecer metas de produto que sejam realistas e motivadoras em um ambiente onde as lideranças de tecnologia e produto desempenham papéis fundamentais no sucesso da empresa.
BossaBox — Você acredita que a incorporação das métricas de produto no cálculo de ROI proporciona uma capacidade mais ágil de resposta às mudanças no mercado?
Cheila Portela — Utilizar métricas de desempenho do produto, além das financeiras, no cálculo do ROI é essencial para aumentar a agilidade na resposta às mudanças de mercado. Isso ocorre porque muitas vezes o retorno financeiro demora a se manifestar, especialmente em fases iniciais como o MVP, ou durante certas etapas do desenvolvimento do produto, que exigem tempo e investimento significativos antes de gerar resultados financeiros palpáveis.
Ao adotar métricas intermediárias de produto como estratégia de demonstração de valor incremental ao longo de um projeto, é possível ter uma percepção mais imediata se o produto está caminhando na direção certa. Isso permite realizar ajustes estratégicos com mais rapidez, sem precisar esperar pelo resultado financeiro final.
Em minha própria experiência, já me deparei com produtos que, após um ano ou mais de desenvolvimento, alimentavam a esperança de um retorno financeiro que, ao analisar métricas de conversão intermediárias, mostrava-se improvável, “a conta não fechava”. Caso indicadores de performance do produto tivessem sido monitorados desde o início, teria sido possível identificar mais cedo que o caminho adotado não levaria aos resultados financeiros esperados, possibilitando a realização de ajustes ou até mesmo uma mudança de direção.
Ao adotar uma abordagem mais ágil e baseada em dados concretos, é possível otimizar recursos, melhorar a gestão de equipes e evitar expansões desnecessárias ou reduções de pessoal, alinhando o crescimento da equipe ao atingimento de metas realistas e à necessidade de recursos.
Em resumo, a integração de métricas de produto no cálculo do ROI é essencial para uma gestão de produto eficaz, permitindo respostas rápidas e informadas às mudanças do mercado e contribuindo para o sucesso financeiro e estratégico de longo prazo.
BossaBox — Como você equilibra a necessidade de manter a produtividade da equipe de produto enquanto garante a qualidade e integridade dos dados utilizados?
Cheila Portela — Equilibrar a produtividade da equipe de produto com a garantia de qualidade e integridade dos dados é uma prioridade inegociável na minha visão. Isso porque, sem os dados para tomar decisões informadas, muito em breve a liderança vai se ver sem visibilidade alguma de qual o próximo passo a dar. Já vi isso resultar em investimentos enormes e no momento errado em um funil não otimizado, assim como o contrário: muitas vezes você até tem um resultado positivo para demonstrar, mas sem conseguir organizar seus dados para isso.
Uma coisa importante é que manter a integridade dos dados vai além da escolha de tecnologias avançadas ou na moda. A chave não está em adotar necessariamente soluções complexas que suportam grandes volumes de dados – especialmente em fases iniciais como o MVP, onde ainda se está definindo a escala real necessária para o produto. A discussão entre as equipes de produto e desenvolvimento deve focar em tecnologias que sejam rápidas e fáceis de implantar e gerenciar, adequadas ao volume de dados que o produto realmente precisa suportar. O papel da equipe de produto é crucial nesse processo, indo além da coleta de requisitos.
Em resumo, a garantia de qualidade e integridade dos dados, mantendo a produtividade da equipe de produto, depende de uma abordagem equilibrada que prioriza planejamento estratégico sobre a adoção de tecnologias complexas, junto com uma colaboração estreita entre produto e desenvolvimento para assegurar que as soluções adotadas sejam as mais adequadas para o cenário atual e futuro do produto e muita atenção ao desenho da jornada do dados.
A jornada do usuário importa, e muito, mas sem um desenho adequado da jornada que o dado fará em paralelo com essa jornada de usuário, é muito provável ter problemas no futuro. Muitas vezes, nem é algo que vai adicionar tempo e esforço significativo ao desenvolvimento, é mais uma questão de planejamento da arquitetura dos dados. Essa deve ser uma pauta constante entre times de produto, dados e tecnologia
BossaBox — Além dos resultados tangíveis, como você aborda a comunicação do valor do time de produto e dados para a alta liderança?
Cheila Portela — Penso que é crucial adotar uma abordagem proativa e estruturada no estabelecimento e na comunicação de metas. Sempre tento evitar apenas reportar resultados quando me pedem, apenas ter metas se alguém de um nível de liderança mais alto decidiu que o time precisa ter. Mesmo que ninguém esteja perguntando ativamente sobre os avanços do produto, mantenho comunicação de news sistemática e estruturada para os stakeholders.
Metas devem ser definidas com base em estimativas matematicamente coerentes, demonstrando claramente como os objetivos específicos do time contribuem para os resultados gerais da empresa. A comunicação eficaz começa pela forma como as metas são estruturadas, requerendo um processo dialógico que integra as expectativas da empresa com as capacidades concretas de entrega do time.
Esse movimento visa o estabelecimento de metas que sejam preditoras dos resultados desejados pela empresa, fazendo uso de estimativas que ligam diretamente ações específicas do time aos impactos esperados nos resultados macro.
Uma prática eficaz para manter a comunicação alinhada e constante é o uso sistemático de newsletters. Essas newsletters devem destacar as evoluções do produto e como estas contribuem para os resultados tangíveis e estratégicos. Isso incentiva a reflexão contínua sobre se as atividades selecionadas estão efetivamente movendo o ponteiro do resultado da companhia.
BossaBox — Quais desafios você enfrenta na gestão conjunta de dados e produto?
Cheila Portela — Na gestão conjunta de dados e produtos, enfrento uma série de desafios e oportunidades. Um dos principais benefícios é a facilidade em manter ambos os times alinhados em torno dos objetivos estratégicos. A proximidade entre as equipes de dados e produto facilita o uso eficaz dos dados para priorizar tanto os próximos passos quanto o desenvolvimento do produto em geral.
Culturalmente, tanto a área de dados quanto a de produto são vistas como departamentos onde solicitações específicas são feitas, seja para alterações no produto, adição de funcionalidades, criação de novos dashboards ou análises pontuais. Esse cenário pode levar ambas as áreas a serem percebidas primariamente como de apoio ou execução operacional, sem um foco definido em objetivos estratégicos ou um alinhamento claro com as metas do negócio.
O principal desafio reside em balancear o atendimento dessas solicitações pontuais com o desenvolvimento de novos recursos que tenham um impacto tangível e positivo no negócio. É crucial gerenciar de maneira efetiva o uso dos recursos, para não apenas responder a demandas internas específicas, mas também para avançar na evolução estratégica do produto, impactando diretamente nos resultados.
Para superar esse desafio, é imprescindível adotar uma abordagem de priorização baseada em dados, aproveitando a capacidade do time de produto em estabelecer prioridades e a riqueza de informações fornecidas pela área de dados. Esse “casamento perfeito” entre as equipes permite uma sinergia que beneficia ambas, assegurando que suas ações estejam em harmonia com a estratégia geral da empresa.
BossaBox — Na sua visão, qual é o papel das metas realistas na promoção de um ambiente de trabalho saudável em times de produto e tech?
Cheila Portela — Acredito firmemente que metas ambiciosas devem, por definição, ser também realistas. A distinção aqui é crucial: uma meta ambiciosa bem calculada impulsiona o time a alcançar novos patamares de sucesso, enquanto uma meta irrealista é, na verdade, um sinal de planejamento falho e necessariamente levará a uma frustração coletiva, já que nunca será atingida se não é realista. Ela não apenas deixa de ser genuinamente ambiciosa, mas pode também desmotivar a equipe.
As metas precisam emergir de uma análise rigorosa, levando em conta os recursos disponíveis, a capacidade da equipe e as projeções realistas do que pode ser alcançado. Esse processo deve evitar a armadilha de metas derivadas de brainstormings superficiais ou escolhas arbitrárias, enfatizando, em vez disso, o uso de dados e análises estatísticas para fundamentar as decisões.
Equilibrar a ambição com o bem-estar da equipe significa reconhecer que o alcance das metas não deve vir à custa da saúde ou da satisfação dos membros da equipe. Isso implica em um planejamento cuidadoso que considera não apenas o que queremos alcançar, mas também o que é realisticamente possível dentro dos limites dos nossos recursos humanos e técnicos.
BossaBox — Quais concepções equivocadas ainda representam obstáculos para o desenvolvimento e gestão de equipes de produto de alto desempenho?
Cheila Portela — Uma dessas concepções é a visão do time de produto como meros executores de pedidos, ignorando a responsabilidade crítica de curadoria e análise que deveriam exercer sobre as sugestões recebidas. A ideia de que qualquer sugestão deve ser automaticamente transformada em tarefa subestima a importância de um julgamento criterioso e fundamentado.
Além disso, a execução de projetos de longo prazo, com escopos fechados e prazos extensos, ainda é uma prática comum “no mundo real”, embora todo nosso discurso seja apoiado na abordagem ágil que privilegia MVPs (Produtos Mínimos Viáveis) e entregas incrementais. Esse método limita a capacidade de resposta rápida às mudanças de mercado e ajustes na direção estratégica, enfatizando a importância de planejar entregas que gerem valor contínuo e permitam a interação baseada no feedback dos usuários.
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Não digo que é fácil, pois você precisa “quebrar” um grande escopo em entregas incrementais, mapear dependências técnicas para desacoplar as entregas ao máximo possível e entregar real valor a cada release. Eu diria que é até mais cômodo apenas começar um grande projeto e esperar o prazo vir, ajustar o prazo e seguir. Mas não acredito que seja o caminho mais saudável para o negócio e acho que uma mudança cultural precisa acontecer para que sejamos testadores de ideias mais ágeis.
Outro ponto crítico que vejo, principalmente por trabalhar com dados, é a visão de que a análise estatística é altamente especializada, vista como fora do alcance do planejamento cotidiano, quando, na verdade, deveria ser incorporada como uma ferramenta fundamental para a definição de metas realistas e alinhamento estratégico.
Por fim, a tendência de empresas, especialmente as de menor porte, de investir recursos limitados no desenvolvimento interno de funcionalidades de back-office genéricas e já disponíveis no mercado, em vez de focar em descobrir o que poderia realmente diferenciá-las no mercado, fortalecer seu core e entregar valor para seus usuários diretamente, e não apenas para o time interno.
É muito comum a má alocação de esforços em desenvolvimento de partes do sistema que não trazem valor agregado significativo ao negócio. Isso demonstra a importância de concentrar a inovação e o investimento em tecnologia em áreas que ofereçam vantagens competitivas, em vez de reinventar soluções que já estão disponíveis no mercado e não contribuem para a proposta de valor única da empresa.
Esses desafios sublinham a importância de repensar abordagens tradicionais para o desenvolvimento de produtos e a gestão de times, promovendo uma cultura que valorize o planejamento estratégico, a análise baseada em dados e o foco em inovações que diferenciam verdadeiramente a empresa no mercado.
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